fevereiro 06, 2008

mais três excertos, mas...

... desta vez a partir de Nightwood, de Djuna Barnes

(1)
Por temperamento Nora era uma cristã precoce; ela acreditava na palavra. Há um iato na "dor do mundo" através do qual o particular cai continuamente e para sempre; um corpo em queda no espaço observável, desprovido da privacidade do desaparecimento; como se a privacidade, afastando-se interminavelmente, pelo mesmo poder sustentador da sua retirada mantivesse o corpo em queda eternamente, mas num só lugar, e perpetuamente defronte do olhar. Assim era Nora. Havia uma perturbação no seu equilíbrio que a mantinha imune à sua própria queda.
Nora tinha o rosto de todos os que amam a pessoa - um rosto que seria maldoso quando ela descobrisse que amar sem crítica é ser traído. Nora roubava-se em favor de toda a gente; incapaz de prevenir-se a si mesma, virava-se continuamente para se descobrir diminuida. viajantes de todo o mundo achavam-na lucrativa no sentido em que ela podia ser vendida por um preço eterno, pois que carregava o dinheiro da sua traição no seu próprio bolso.


(2)
[O'Connor dirigindo-se a Nora] 'Para pensar no fruto é necessário tornar-se árvore. E a árvore da noite é a mais difícil de subir, a mais desolada de escalar, a mais difícil de ramificar, a mais febril ao toque, e transpira uma resina e goteja uma pasta contra a palma da mão que o cálculo não apostou. Gurus, que, acredito que saiba, são professores Indianos, esperam que contemple o fruto por dez anos consecutivos, e se, nesse tempo, não tiver adquirido mais conhecimento sobre o fruto, não será muito brilhante, e essa pode ser a única certeza que sairá da experiência, o que é uma melancolia pós-graduada - pois nenhum homem pode encontrar uma verdade maior do que os seus rins o possam permitir. Assim, eu, Doctor Matthew Mighty O'Connor, peço-lhe que pense na noite durante o dia, e sobre o dia ao longo da noite, ou tudo voltará pesadamente sobre si durante um qualquer alívio do cérebro - um motor parando-se sobre o seu peito, parando as suas rodas dentadas contra o seu coração; a não ser que você lhe tenha feito um caminho.

(3)
'Ah, majestosa incerteza!' disse o doutor. ' Já pensou em todas as portas que se fecharam pela noite e que se voltaram a abrir? De mulheres que procuraram por aí com candeeiros, como você, cirandando sobre pés rápidos? como mil ratos elas vão de um lado para o outro, agora rápido, agora devagar, algumas parando atrás de portas, algumas tentando encontrar as escadas, todas aproximando-se ou deixando a sua carne de rato deslocada, que se esconde numa qualquer fresta, num qualquer sofá, deitada sobre um qualquer chão, atrás de qualquer armário; e todas as janelas, grandes e pequenas, a partir das quais o amor e o medo se mostram, brilhando e em lágrimas? disponha essas janelas de um extremo ao outro e terá uma janela que dará a volta ao mundo; e ponha esses mil olhos num único olho e terá a noite prescrutada a pente fino com a grande lanterna cega do coração.

[tradução arriscada por ka]
[editora faber and faber]

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