novembro 29, 2011

Elegia [Rainer Maria Rilke]

...

Quem é que assim nos virou, de tal forma
que, em tudo o que façamos, estamos sempre na atitude
de alguém que parte? Como esse que parte,
no alto da última colina que mais uma vez
lhe mostra todo o seu vale, se volta, pára, se demora -,
assim vivemos nós, sempre a despedir-nos.

[final da oitava elegia (de Duíno), Rainer Maria Rilke] 
[ Ed. O Oiro do Dia, Porto, 1983, trad. Paulo Quintela]



[outra tradução]
...

Quem assim nos pôs ao invés, de tal maneira
que, o que quer que façamos, sempre estamos
na atitude de alguém que parte? E tal como esse alguém
pára na última colina, que  uma vez mais lhe põe diante
o seu vale, e olha em volta e se detém ---,
assim vivemos nós, em despedida sempre.

[final da oitava elegia (de Duíno), Rainer Maria Rilke]
[Assírio & Alvim, trad. M.Teresa Dias Furtado]

novembro 20, 2011

marlene on the wall [suzanne vega]


[Suzanne Vega, 1985]


novembro 09, 2011

o Credo final [Maria Teresa Horta]

(...)
   Renata encostou o rosto ao peito do marido a tentar escutar-lhe o coração que nem sabia se alguma vez batera mais depressa quando se abraçavam.
   Ficou debruçada muito tempo a olhá-lo, o risco sanguíneo já seco, na pele da cara, a formar uma espécie de cicatriz ou queimadura por onde passou depressa as unhas.
   A tentar pensar com calma.
   A imaginar como seria depois; depois da morte dele.
   Já não era preciso dizer a si própria que o amava: amava-o; garantir a si própria que o amava: amava-o.
(...)
[Antologia de Contos, Com a mão firme e doce
Maria Teresa Horta, Dom Quixote, 2009]

chamemos-lhe Credo 2, em 3 [Novas Cartas Portuguesas, 3 Marias]

De como pode a morte ser mais fácil do que o amor.
Ou lamento de Mónica e Maria


"Deixa-me que fuja"
(...)
    Como o sol queima na boca.
    Sufoco, bem vês, sufoco. Esta espécie de sono que me mata, me imobiliza aqui deitada a teu lado, estas paredes por onde passo as mãos até as ferir na cal quebradiça, mordida pelos séculos e os ratos que nela construíram os seus ninhos.
    As tuas costas. As tuas costas meidas de lisura: Tal como o mar corta a pele na fuga. E saber eu seres só tu a me poder ajudar. Repara: tens a chave. A chave que todos os dias rodas com um ruído seco na fechadura oleada, e então a porta desliza nos gonzos, silenciosa...
(...)
    Tua não, presa me tens e por tua me tomas em engano da verdade, bem o tentas e bem o sentes e prisioneira sou da tua liberdade.
   Que tempo me restará ainda?
   Apenas tu o pressentes, mas impassível esqueces e adormeces deitado a meu lado, em hábito tranquilo, meus cabelos afagando com cuidado.
(...)
   Meu amor: e eis que fujo, me apodero de mim. A arma apontada ao teu peito nem sequer parece ameaçadora, mas apenas fria, indiferente, vigilante.


   Meu amor:


   Poder-me-ás algum dia perdoar esta morte?
(...)
15/5/71

[Novas Cartas Portuguesas, Edições D. Quixote, 2010]

novembro 08, 2011

Credo [Enzo Cormann]

[monólogo que surfa nas ondas de Novas Cartas Portuguesas]
[Edições Cotovia, 1990]
(...)

       Pensava portanto nela, ontem na cozinha, e percebia enfim que a maior beleza é sempre silenciosa, e que faltaria sempre à minha vida - como sem dúvida à tua - uma parte de verdadeiro mistério. Por isso, matar-te constituía uma espécie de cerimónia através da qual, imolando-te,  obtinha para sempre silêncio e beleza. Pensava por outro lado que esse gesto permaneceria como o único acto de fé de toda a minha existência. Esta perspectiva serenou-me e comecei a acreditar plenamente na simples suposição de que tinhas cometido um crime tal que eu me devia vingar; e que essa vingança consistiria no teu assassinato. 


(...)
       Sabes, não vale a pena olhares-me dessa maneira. Aliás que poderias tu ver? Não há nada para ver aqui, a não ser um pouco de espaço inerte e frio.
      Eu própria, sabe-lo bem, não sou senão uma colecção de palavras e de ruídos. De saia que se amarrota e de cólera que se retém. De dor também; de ventre, e de cabeças esmigalhadas. 
      Sentes como tudo isso é transparente? Como tudo isso pode subitamente pôr-se a oscilar no ar como penugem? Alguma vez ouviste o mar numa concha? Nada mais do que o ruído do teu próprio ouvido e do que tu queres ouvir. 
      Eu própria não sou senão um pouco de ar cativo de um labirinto abstracto. Um pouco de ar, compreendes? Nem louca, nem só, estás a ver; mas simplesmente ---

novembro 04, 2011

rapaz ou rapariga?

bem... rapariga/menina/moça já há uma. gosta de cor de rosa e de "berlicoques" brilhantes. dizem-me que é normal para a idade, que depois estas coisas desaparecem. como se fosse necessário o excesso para dar espaço ao razoável. não sei, tenho as minhas dúvidas. sempre privilegiei o prático ao estético, sempre preferi calcorrear uma cidade inteira a ficar com o passo preso por uma saia ou um salto enfiado na calçada...descer perigosamente uma estrada inclinada em duas rodas com o alcatrão a ameaçar a ganga, a passear as duas rodas pelo passeio aprumado, de sandália com o dedo grande do pé a espreitar o paralelo...
quanto a rapaz/menino/moço não tenho qualquer experiência, a não ser um primo, aliás, quase dois primos. mas até me parece que um pikeno é capaz de encontrar mais afinidades com uma tia meio esgrouviada. tendo dito isto, não é que me possa queixar da sobrinha-mais-que-tudo. :) venha daí um rapaz, então!