...I have sand in my scalp, sleepy sand in eyes, sandpaper tongue, sand thoughts all from the sea. That is where I was instead of anything else all Weekend...
Francesca Woodman, 1973
Olho as imagens criadas por Francesca Woodman, imagens que ela habita com uma presença inquietante. Fragmentos surreais. Imprimem-se em mim.Na minha cabeça um tornado de imagens, o meu corpo cheio de movimentos perdidos... ...Os meus olhos sentem-se de areia. São de areia. Desfazem-se com o vento. Dissolvem-se, transformam-se, transformam-me, modificam o que vejo e o que não vejo torna-se visível. Sinto-me cansada ultimamente... de areia, sem ossos.
Cláudia Nóvoa, Setembro 2007
e assim nasceu Olhos de Areia. o meu regresso aos corpos moldáveis, à plasticidade das emoções, embalada com a descoberta do quinteto de Mário Franco, deixando-me abraçar pelo contrabaixo, a querer saltar para o palco e também eu agarrar duas mancheias do meu cabelo curto, como que suspendendo-me do céu, agitando-me o corpo, guiando-me por entre o espaço vazio, como quem estende uma toalha sobre a areia da praia, ou um corpo nas profundezas do mar, ou uma folha de papel recém escrita a tinta permanente que se quer secar. qualquer coisa assim, o flutuar num espaço de leveza contraposto à dureza do gesto da suspensão, a fragilidade de um cabelo e a resistência imbatível de toda uma cabeleira... no fim, resta mesmo a tinta... mas é preciso ver.
[foto (esq) de Olhos de Areia por António Rebolo, foto(dir) de Francesca Woodman, from Space2 (Providence, RhodeIsland, 1975-1976)] e já agora... um interessante cruzamento entre a obra de Woodman e Helena Almeida, aqui. Sem dúvida que o acaso não é responsável pelos cruzamentos que vão aparecendo no caminho.
Que trouxe Kieslowski nos seus filmes, senão janelas para o ser, o sentir, retratos de almas que se transportam para a interioridade não-consciente de existir? De que tratam os seus filmes? Não é o enredo que me prende, mas o tempo, o tic tac de vidas entrecruzadas, num mundo que, ainda que em turbulência, abre espaços e disponibilidades para a busca do sentido. A urgência, (deveria escrever a prioridade) vem de dentro, não do excesso de informação nem do cronómetro das nossas rotinas. Rever Vermelho transportou-me para o tempo da ausência de urgências quotidianas. O filme marca o ritmo. A (tele)comunicação suporta-se no tradicional telefone por fios, as notícias chegam em papel, as denúncias seguem por carta. A distância sente-se, assim como a urgência do seu estreitamento. O filtro da distância, seja temporal ou espacial, actua. O ritmo do tempo já não é o destes dias. Com Vermelho fica o impulso (por ironia urgente!) de ver La duple vie de Veronique. Obra prima onde o tic tac da procura matura de dentro para fora do ser, paciente.
Invejo o tempo musical deste entrecruzar de experiências e de vidas ficcionadas que Kieslowski deixou. Saudades.
Deus queira que esta Vos mate a fome aos sentidos Por agora
Deus queira que esta Vos guarde a dor aos gemidos Noite fora
Dançamos fandangos Sobre uma navalha Pássaros em bando Em nuvens de limalha
E assim eu cá vou indo.
Vem-me o fel à boca As tripas ao coração A noite trás a forca pela sua mão
Sonho com fantasmas De pele preta e luzidia Com manuais de coragem e cobardia
Dizem que há sempre Um barco azul para partir Nosso hino Embarca a alma E os restos de um rosto a sorrir Do destino
Põe o meu retrato No altar de S. João E uma vela com formato de canhão
Cansa-se esta escrita Com dois dedos num baraço Assim o quis a desdita Vai um abraço. [Música: João Gil, Letra: João Monge, "Sepes" / Trovante]
não encontrei uma amostra audio, para relembrar a beleza da música fico a cantarolar o "Põe o meu retrato no altar de S. João e uma vela com formato de canhão..."
não ficámos roucos nem perdidos, mas cantámos com sentimento. obrigada pelo revivalismo. e este nem e' o melhor espécime a mostrar. talvez apareçam mais por aqui.
[Trovante, Deixa Lá, letra Luis Represas]
ps: o círculo não se fecha, mas volto ao início, à boleia do Trovante.
pps: quantos graus teria esta preciosidade alentejana, hoje?
Um resto de chão esculturas de Ana Rute de Medeiros, na Galeria Arthobler.com o desafio "e o que sentir quando a ausência de memória se compara à inutilidade do ser? E o que fazer quando já não se gosta do que se é e o desejo de não pensar em si próprio se torna a maior ambição quotidiana?"
Ray Smith e os seus Cadavre Exqui na Galeria Fernando Santos
Je croyais, quand j'étais jeune, que j'avais une vie devant moi; mais une vie, n'est jamais ni devant ni derrière, ce n'es pas quelque chose qu'on a, c'est quelque chose qui passe.
Belo, chocante, e sensibilizador. Peace on the Streets (rádio ChoiceFM, Londres):
Qual a correlação entre este vídeo e a Choice FM? A Choice FM é uma pequena estação de Rádio sediada em Londres que aposta fortemente nos laços com os seus ouvintes. A sua escolha musical reflecte a diversidade multicultural da sociedade londrina. E é aqui que se encontra a correlação. A estação arrancou com a campanha Peace on the Streets, posicionando-se claramente contra o uso de armas e apostando na sensibilização pacifista da comunidade. Esta campanha parece ser apenas mais um projecto resultante do carácter particular da Choice FM, a procura do diálogo e de acção positiva sobre os problemas sociais que vão sendo identificados. Não sou perita na área. Surge-me imediatamente a questão: existe alguma rádio, em Portugal, que tenha uma missão/acção semelhante?
... como esta vontade súbita, quase incontrolável, de rever "Morte em Veneza" (Luchino Visconti)... ... ou de correr a uma livraria para agarrar o romance de Thomas Mann... (já lá vão 10 anos!)
Uma pessoa no salão. Uma escadaria para a cave, mesmo ali. Outra pessoa no terceiro degrau descendente das escadas, de grade de garrafas nas mãos. Uma garrafa solta que decide descer antes de todas as outras. A queda da garrafa acompanhada de ricochete intermitentemente imprevisível nos degraus. O estampido vidro-pedra a cada impacto. As duas pessoas congeladas, expectantes, apreensão pela previsibilidade da quebra. E um.... e dois... e três ricochetes... os degraus que não acabam... e quatro... a garrafa vai sobreviver... e cinco. O chão da cave, finalmente. A garrafa partiu o lábio-gargalo no último embate.
Vários coincidências fizeram-me chegar a hmbf. Uma passagem pela Livraira Leitura na Fábrica Braço de Prata, um livro extremamente apelativo da nova editora Ovni, e depois o novo número da Ode dedicado à Fusão. Vai daí... espreitar o blogue deste senhor, de nome abreviado Insónia, e depois descobrir estes pequenos seres microbiais a vadiar por ali... a amostra mais recente:
Micróbio #289
Queria apenas dizer: uma coisa. E disse. Não sabia o que pensar sobre o assunto. E não pensou. Mas tinha que escrever algo sobre isso. E escreveu. Depois deitou-se cansado, dormiu descansado, acordou de novo, morreu de velho. Há vidas incríveis.
o cinema português não envergonha. sem elevar o tom a casos de genealidade, temos realizadores com estilos próprios e eficientes, bons actores, e até boas histórias. talvez que os meios de produção nem sempre sejam os mais adequados, mas, como noutras artes, a escassez também desafia e estimula a criatividade. e que dizer do publico português, dos seus gostos, e espírito crítico?
ide ver Call Girl, que não ficareis envergonhados. a história de corrupção é um pouco previsível (até o desenlace). os actores fizeram um excelente trabalho. desde a Soraia, à participação fugaz do Raúl Solnado. o filme não é só Soraia! ainda que infelizmente o trailer o possa fazer entender. mas... será uma experiência que não trará nada de novo. não desafia, nem enche medidas. bom para anestesiar outros pensamentos.
se quereis mesmo uma temática de corrupção, jogos de interesses e tráfico de influências, ide em alternativa atrás de um outro filme português, dando-lhe todo o benefício da dúvida, de espírito esvaziado. concedendo espaço ao repôr de todas as medidas: da comédia, da sátira, da realidade deste nosso jardim português à beira mar plantado, da fotografia, ... e até da poesia:
Tráfico, de João Botelho,
Acerca de Tráfico (1998), João Botelho:
Tudo começa quando uma família normal e friorenta, obrigada a passar férias fora de época por dificuldades económicas, é bafejada pela sorte. Jesus, assim se chama o filho do casal, encontra enterrado na areia da praia deserta, um tesouro escondido e proibido: a riqueza da Terra. No mesmo dia e não longe dali dois padres decidem fechar as portas da sua igreja por falta de crentes e fazem um leilão de imagens dos seus queridos Santos. Entre a riqueza dos céus e o espírito da matéria partem à aventura. Um banqueiro com alucinações auditivas quando fala do seu dinheiro e as respostas de um ministro com alucinações visuais quando trata de influências. Uma mulher elegante, suave e misteriosa, com uma bela cabeleira falsa e esplêndidas cores, incendeia tudo por onde passa. Um general à volta com traficâncias de armas e a sua pequena mulher à volta com artes, Olimpos e cabelos disparatados. E muitas mais aventuras. Como os ricos verdadeiros e antigos se divertem, como os ricos novos ou falsos encontram dificuldades e como tudo acaba em bem.
“Sejamos facciosos para reparar as injustiças do mundo”. Shakespeare
Recomeça… Se puderes, Sem angústia e sem pressa. E os passos que deres, Nesse caminho duro Do futuro, Dá-os em liberdade. Enquanto não alcances Não descanses. De nenhum fruto queiras só metade. E, nunca saciado, Vai colhendo Ilusões sucessivas no pomar E vendo Acordado, O logro da aventura. És homem, não te esqueças! Só é tua a loucura Onde, com lucidez, te reconheças.