no Estúdio Zero, Porto
até 2 de Novembro Terça a Domingo às 21h45
texto de Ingmar Bergman pela companhia As Boas Raparigas
| Encenação: João Pedro Vaz Tradução: Armando Silva Carvalho Cenografia: Cláudia Armanda Design de Luz: Nuno Meira Sonoplastia: Luís Aly Figurinos: Catarina Barros Elenco: Maria do Céu Ribeiro e Sandra Salomé
| [foto:AsBoasRaparigas] |
Sinopse [daqui]
A actriz Elizabeth Vogler deixa de falar durante uma representação teatral de Electra. O seu mutismo em relação aos que a rodeiam é total, sendo então internada numa clínica. Não está doente, simplesmente optou pelo silêncio. Alma, uma jovem enfermeira, fica encarregada de tratar dela. Quando, a conselho médico, as duas se isolam numa ilha, passam a desenvolver uma intimidade e cumplicidade crescentes. Com isso estabelece-se uma constante troca de identidades.
Ingmar Bergman escreveu Persona para o cinema: "O que eu escrevi não é um argumento de um filme no sentido habitual do termo. É algo que se assemelha mais a uma linha melódica que irei orquestrar (...). Por isso eu convoco a fantasia do leitor ou do espectador a fazer uso livre dos elementos que coloco à disposição." [Lágrimas e Suspiros, Persona, Dependência, I.Bergman, Assírio&Alvim]
este pequeno enquadramento pode ajudar a desvendar as opções de encenação do texto, tarefa que exige alguma ousadia, sendo o filme de Bergman tão marcante e bem conseguido. o público do Estúdio Zero deve dividir-se entre os que viram o filme e os que o não viram, entre os que dele se abstraem e os que o têm presente. o que aqui escrevo não é imune às minhas memórias do filme ao longo do decorrer da peça - e se dele me tivesse esquecido, estava lá um televisor para mo lembrar.
imagino que Persona toque cada pessoa de forma diferente. fascinam-me: o processo de descoberta entre Alma e Elizabeth, a comunicação de extremos entre o silêncio de expressividade corporal e a voz, a busca do diálogo contrastando com a busca do silêncio. desde a primeira vez que vi Persona que procuro uma razão para que o silêncio vocal de Elizabeth não se estendesse também à escrita: existem as suas cartas, entre as quais Aquela que marca a dinâmica da história. mas acima de tudo isto fascina-me o processo de troca/assimilação de identidades.
quanto à peça, desempenhos fortes com uma cenografia que me pareceu algo exagerada. não encontrei referências para a intenção do trabalho de João Pedro Vaz. talvez tenha procurado distanciar-se o mais possível do filme. sendo essa a sua opção não me parece conseguida. o processo de assimilação de identidades não é tão bem conseguido, até confuso.
leio o final da peça como um trunfo a Alma que, pela assimilação da personalidade de Elizabeth, consegue desvendar a actriz. na peça tudo é dubio. Elizabeth surge vestida de Alma, mas o personagem não deixa de ser Elizabeth. Alma demonstra bem a assimilação da frieza e a crueldade, características psicológicas de Elizabeth.
a história é muito mais do que assimilações, cenários, jogos de luz: o peso da(s) farsa(s) que transportamos nas nossas vidas - na peça, a farsa na existência de Elizabeth Vogler - longa discussão para mesa de café.
gostava muito de ver este mesmo Persona de João Pedro Vaz com a actriz Maria do Céu Ribeiro no papel de Alma, e a Sandra Salomé no papel de Elizabeth. um desafio... talvez alguém
ouça...
a não perder, as fotografias em exposição no Estúdio Zero!